ANENCEFALIA,
AQUISIÇÃO DE DIREITOS
E CONCEITO DE MORTE
(Resolução 1.480/97
do Conselho Federal
de Medicina
)

 

 

                            Marília Andrade Dos Santos
 

Sumário: 1. Introdução; 2. Da aquisição de direitos; 3. Da perda de direitos; 4. Da anencefalia: conceito e características; 5. O status do anencéfalo e a aquisição de direitos. 6. Conclusão; 7. Bibliografia

 

 

1 INTRODUÇÃO

O Direito brasileiro concede uma ampla proteção ao indivíduo. Tanto é assim que a Constituição Federal - CF reservou um Título inteiro para a abordagem “dos direitos e garantias fundamentais”, utilizando doze longos artigos para tratar do tema. No entanto, o rol não é taxativo, e fez a CF questão de dizê-lo, como se percebe da análise do §2° do art. 5° da Carta Magna[2].Verifica-se, portanto, que a concessão e a proteção destes direitos é matéria de extrema relevância para o estudo do Direito e para seus operadores.

Ocorre que a aquisição de direitos, até então questão pacífica, tanto para a doutrina quanto para a jurisprudência, navega por águas tormentosas quando se procede a análise da situação do anencéfalo. E isso, principalmente, a partir dos últimos anos, com os avanços das técnicas médicas, quando foi possibilitado saber com antecedência se, no parto, será dada luz a um feto portador desta anomalia. Este feto adquire direitos? Se a resposta for positiva, em qual momento de sua existência os perde? Adquiriria patrimônio após o nascimento com vida?

Estas questões ganham relevância ainda maior se for considerado que o Brasil possui a quarta maior incidência de gravidezes de fetos anencefálicos do mundo, ficando atrás apenas de México, Chile e Paraguai, conforme dados da OMS – Organização Mundial da Saúde[3].

Em razão destes dados, este estudo visa tornar mais clara a situação da aquisição de direitos pelos fetos portadores de anencefalia. Para tanto, serão analisados os requisitos para a aquisição de direitos, as categorias de direitos com os quais um indivíduo pode ser contemplado, os conceitos de morte adotados pela Medicina e, principalmente, os critérios legais para a aferição do término da personalidade civil, em especial o critério de morte encefálica introduzido no ordenamento jurídico brasileiro em 1997 com a Lei 9.434.

Por fim, após análise dos posicionamentos dos doutrinadores acerca do tema, será estabelecida uma solução que, espera-se, esteja de acordo com a realidade física e social do anencéfalo.

 

2 DA AQUISIÇÃO DE DIREITOS

 

Reza o art. 1° do Código Civil - CC de 2002 (melhorando a redação do art. 2° do CC de 1916) que toda pessoa é capaz de direitos e de deveres. O conceito de pessoa trazido pela norma civil abrange o conceito de pessoa natural (ou ente humano), mas com ele não se confunde. Isso porque é pessoa tanto o ente humano como o ser criado pelo homem que, de uma forma ou de outra, possa ser sujeito de direitos (pessoa jurídica)[4].

Ao conceito acima colacionado se integra um instituto que está presente em todos os ramos do Direito: a capacidade. Com relação especificamente ao Direito Civil, a capacidade pode ser traduzida como a aptidão do indivíduo de se tornar sujeito de direitos, de possuir direitos e deveres civis.

Esta aptidão manifesta-se de duas formas, de acordo com as possibilidades de ação do sujeito. Pode ser capacidade de direito ou de gozo ou capacidade de fato ou de exercício. A primeira expressa a capacidade/possibilidade de adquirir direitos e deles fruir, bem como de contrair deveres e/ou obrigações. A segunda é aquela através da qual o indivíduo pode, ele mesmo, praticar os atos da vida civil, sem contaminá-los com o vício da nulidade ou da anulabilidade. É a esta última capacidade (ou à sua falta) que o CC faz alusão em seus artigos 3° e 4°[5].

De se ressaltar que a capacidade aludida no art. 1° do CC não torna automaticamente o indivíduo titular de direitos, que somente os possui no momento em que adquire personalidade civil. Esta pode ser resumida como a reunião dos direitos e deveres de um indivíduo, fazendo de um ser animado uma pessoa[6].

O conceito de personalidade, embora esteja intimamente relacionado ao de capacidade, com este não se confunde. Capacidade é atributo da personalidade. “Capacidade exprime poderes ou faculdades; personalidade é a resultante desses poderes; pessoa é o ente a que a ordem jurídica outorga esses poderes”[7].

Quanto aos requisitos para a aquisição da personalidade, alguns códigos civis fizeram várias exigências: forma humana, viabilidade e vida autônoma com relação à mãe por determinado período[8].

Analisando-se apenas o aspecto objetivo de cada um dos requisitos é possível perceber um problema de difícil solução: a complexidade de conceituação. Ora, o que se pode definir como forma humana? Quanto tempo é necessário para que o indivíduo sobreviva fora do útero materno para que seja considerado digno de adquirir personalidade jurídica? Quais os tipos de doença que podem indicar uma não-viabilidade de vida? Aquelas que condenam o indivíduo à morte, mesmo que não se saiba quando esta ocorrerá?

Buscando fugir de conceituações duvidosas e problemas de interpretação, nosso sistema jurídico não se centrou nestes requisitos, requerendo apenas para a aquisição de direitos pelo nascituro[9] o nascimento com vida. Pressupôs, assim, que todo produto de mulher é um ser humano por excelência e que não é a viabilidade ou potencialidade de vida que tornam um feto mais ou menos digno da proteção do Estado e da aquisição de direitos.

No entanto, mesmo erigindo o nascimento com vida como requisito indispensável à aquisição da personalidade, o ordenamento jurídico pôs a salvo (como melhor será tratado adiante) os direitos deste ser em formação desde a concepção.

Não existem dúvidas da ocorrência de vida quando o indivíduo nasce e cresce, seguindo o ciclo normal da vida. A questão torna-se menos singela quando o feto, logo após o parto, vem a falecer. Como saber se efetivamente viveu?

A vida é entendida pelo Direito, nestes casos, como a ocorrência de respiração, sob a máxima: respirou, logo nasceu com vida. É o que se depreende da análise do art. 53, §2° da Lei 6.015/73. Mas, se houver dúvidas a respeito da ocorrência da respiração, deve-se recorrer à Medicina, através da realização do exame denominado Docimasia Hidrostática de Galeno, pelo qual os pulmões do feto são colocados em água. Se flutuarem, seus pulmões foram cheios de ar pelo menos uma vez, pelo que viveu, adquirindo todos os direitos daí decorrentes. Se, entretanto, seus pulmões afundarem, não houve troca de gases entre o feto e o meio ambiente, não há que se falar em vida e em aquisição de direitos. O feto é, então, um natimorto[10].

Sobre a correção ou não deste critério de declaração de vida e, por conseqüência, da identificação de ocorrência de morte, nos deteremos mais no próximo item, já que aqui se está trabalhando com uma visão geral do funcionamento e dos ditames das leis civis brasileiras.

Quanto ao momento da aquisição da personalidade, os doutrinadores divergem, defendendo três teorias.

A primeira delas, a Teoria Natalista, afirma que o indivíduo somente adquire a personalidade e, portanto, somente adquire direitos, no momento do nascimento. Antes desta ocasião o nascituro nenhum direito possui. Esta doutrina é adotada por vários países, como Portugal, Alemanha e Itália[11].

A Doutrina da Personalidade Condicional ou Falsa Doutrina Concepcionista, apregoa que o nascimento com vida é condição suspensiva para a aquisição de direitos (personalidade). Assim, o nascituro possui, desde a concepção, mera expectativa de direitos, sendo a aquisição plena condicionada ao nascimento com vida. É adotada pelo Código Civil francês[12].

Uma terceira corrente defende que os direitos são adquiridos pelo nascituro desde a concepção, independentemente do nascimento (com ou sem vida). É a Doutrina Concepcionista, adotada, por exemplo, pela Argentina[13].

Existem, ainda, alguns que entendem que o início da vida e, portanto, a aquisição de direitos, somente se daria com a nidação[14] ou com a formação das células nervosas do embrião – o que ocorre aproximadamente no décimo quarto dia após a fecundação. No entanto, tais posicionamentos são minoritários e (ainda) não foram adotados pela legislação civil, pelo que não merecem maiores comentários.

Grande parte da doutrina brasileira entende ser a Teoria da Personalidade Condicional a teoria adotada por nosso ordenamento jurídico. Veja-se o que foi dito por Sílvio Venosa:

 

O fato de o nascituro ter proteção legal não deve levar a imaginar que tenha ele personalidade tal como a concebe o ordenamento. O fato de ter ele capacidade para alguns atos não significa que o ordenamento lhe atribua personalidade. Embora haja quem sufrague o contrário, trata-se de uma situação que somente se aproxima da personalidade. Esta só advém do nascimento com vida. Trata-se de uma expectativa de direito[15].

 

O mesmo é defendido por Nélson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery e por Orlando Gomes:

 

(…) Mesmo não havendo nascido com vida, ou seja, não tendo adquirido personalidade jurídica, o natimorto tem humanidade e por isso recebe proteção jurídica do sistema de direito privado, pois a proteção da norma ora comentada a esse se estende, relativamente aos direitos de personalidade (nome, imagem, sepultura etc.) (sem grifos no original)[16].

 

A personalidade civil do homem começa do nascimento com vida. Não basta o nascimento. É preciso que o concebido nasça vivo. O natimorto não adquire personalidade (…).

Como visto, desde a concepção asseguram-se direitos ao nascituro equiparado que é à pessoa, no seu interesse. (grifos do original)[17].

 

Roosevelt Arraes, no entanto, entende que o disciplinado pelo CC não possa ser interpretado literalmente:

 

Disposição legislativa que pode levantar dúvida interpretativa é aquela disposta no art. 4° do Código Civil Brasileiro (referência ao CC de 1916. No CC de 2002 o art. é o 2°) que traz a expressão “nascimento com vida” como condição suspensiva para a aquisição da condição de pessoa.

O referido dispositivo legal não pode ser interpretado literalmente. Para superar esta dúvida é importante trazer à lume a lição do Professor Reinaldo Pereira e Silva:

“A resposta é simples: a qualidade de pessoa o nascituro adquire desde a concepção, de maneira incondicionada no que concerne aos direitos da personalidade, como o ‘direito de nascer’, e condicionada ao nascimento com vida para efeitos patrimoniais (doações, legados etc.).”[18] (grifos do original)

 

E conclui:

 

a)   O nascituro possui todos os direitos da personalidade desde sua concepção estando condicionados, ao nascimento com vida, somente a realização de formalidades jurídicas e a aquisição de direitos patrimoniais (…);

b)   Os direitos patrimoniais do nascituro se tornam efetivamente seus, com o implemento da condição suspensiva do nascimento com vida.

 

Parece-nos que Arraes possui maior razão ao minimizar a força doutrinária contida no dispositivo legal, já que, da análise da realidade da prática jurídica, é possível perceber que a incidência da Teoria da Personalidade Condicional não é absoluta.

Ora, para a correta identificação da teoria à qual nosso ordenamento se filia, parece ser necessária a análise do ordenamento jurídico como um todo uníssono (e não exclusivamente do CC) e, principalmente, da natureza dos direitos a serem adquiridos pela pessoa.

Pode-se dividir os direitos do homem em duas vertentes: os direitos que dizem intimamente com a sua qualidade de indivíduo e os que decorrem de vantagens que possuirá frente aos outros indivíduos, com os quais se relaciona. Aos primeiros, chamaremos de direitos de humanidade[19] e, aos últimos, de direitos de relação.

Os direitos de humanidade são aqueles direitos próprios do indivíduo, inatos, decorrentes de sua natureza humana, que são oponíveis erga omnis e que geram o “dever de exigir um comportamento negativo dos outros”[20].

Nesta categoria, podem ser enquadrados todos os direitos ligados à dignidade da pessoa humana, todos os direitos garantidos constitucionalmente e que protegem o homem como ser humano. Dentre eles, podemos citar o direito à vida, à saúde, à integridade física, moral e intelectual, à imagem, à liberdade e à filiação.

Inato é tudo aquilo que nasce com o indivíduo, que está presente desde a sua formação. Assim sendo, os direitos de humanidade são aqueles direitos que estão com o indivíduo desde o momento em que ele pode ser considerado um ser humano. Ora, este momento é precisamente (ao menos de acordo com a posição majoritária) a concepção.

É importante salientar que tais direitos são adquiridos plenamente desde a concepção e admitir o contrário seria falta de observação da realidade jurídica em que vivemos.

Ora, tomando como exemplo o direito à vida, parece no mínimo contraditório dizer que o nascituro tenha expectativa deste direito, vindo somente a adquiri-lo após o nascimento com vida. Se assim fosse, não seria punível o abortamento. E isso, justamente porque um feto abortado nunca poderia nascer com vida para concretizar seu direito a esta vida. Assim, que direito teria sido violado pelo agente ativo do delito? Mostra-se descabida interpretação neste sentido.

Pelo que foi exposto, afigura-se inviável a alegação de que estes direitos somente seriam adquiridos pelo feto com o nascimento com vida, estando apenas resguardados pelo ordenamento jurídico desde a concepção, pelo que inaplicável o entendimento da Doutrina da Personalidade Condicional à hipótese destes direitos.

A situação, no entanto, é diversa no que atine aos direitos de relação, que são relativos ao indivíduo quando relacionado com outros indivíduos e demonstram seu favorecimento ou vantagem em face destes. Tais direitos não teriam existência não fosse a característica essencial e marcante do homem que é justamente o viver em comunidade, o inter-relacionamento.

Este relacionamento somente poderá ser mantido pelo indivíduo após seu nascimento, daí porque o ordenamento jurídico afirmou que somente com o nascimento com vida estes direitos seriam adquiridos.

Entretanto, inegável que desde a concepção o nascituro já existe e, justamente em razão da grande possibilidade de que venha a nascer com vida é que foi estipulada a salvaguarda dos direitos futuros desde o início da vida. Assim, o nascituro possui, desde a concepção, expectativa de adquirir os direitos de relação com o seu nascimento. No entanto, tal expectativa está condicionada ao seu nascimento com vida.

Uma dúvida pode surgir: o nascituro já não mantém relacionamento com outros indivíduos (notadamente com sua genitora)? Então, por que não adquirir os direitos desde a concepção? A resposta há de ser afirmativa, mas merece ressalva.

Este relacionamento mantido pelo nascituro é um relacionamento incipiente, incompleto, já que o nascituro ainda não é um ser autônomo. Não se está aqui a defender a tese de que o nascituro ainda faz parte do corpo da mãe e que, portanto, não seria um indivíduo, mas apenas coisa. De forma alguma!

No entanto, não é possível afirmar que o ser no ventre materno tenha capacidade de se relacionar plenamente com os outros indivíduos. Desta forma, deverá receber os direitos de forma proporcional ao relacionamento que mantém com os demais indivíduos, razão pela qual é impossível que adquira os direitos de relacionamento de forma plena desde a concepção. Assim, se não chegar a manter um relacionamento pleno com os outros indivíduos, a aquisição dos direitos será frustrada, mantendo-se no patamar da mera expectativa.

Fazem parte dos direitos de relacionamento os direitos patrimoniais e os direitos obrigacionais. Note-se a clara presença da necessidade de outros indivíduos para que estes direitos existam e possam ser exercidos pelo seu titular.

Analisando a realidade jurídica, é possível perceber que os direitos de humanidade poderão ser objeto de pedidos judiciais para que sejam respeitados desde a concepção, pois que foram adquiridos de forma plena e incondicional já neste momento. Com os direitos de relação, no entanto, a situação é diversa. É possível que o nascituro pleiteie a garantia destes direitos desde a concepção, que serão cautelarmente assegurados contra lesões, mas o provimento judicial final ficará sobrestado até que ocorra o nascimento, a fim de que se verifique de quem é a titularidade e a legitimidade sobre este direito.

Do acima exposto, torna-se clara a distinção entre as categorias de direitos existentes em nosso ordenamento e a adoção das duas doutrinas de aquisição de direitos (Doutrina da Personalidade Condicional e Doutrina Concepcionista) por nosso ordenamento jurídico.

Da incidência destas duas doutrinas decorre que o indivíduo passa a adquirir dupla personalidade: uma quando é concebido e outra como conseqüência do nascimento com vida. No entanto, tal se apresentaria impossível, já que a personalidade é uma, indivisível. Não é um quantum, mas uma característica da pessoa.

Esta aparente contradição do sistema jurídico é enfrentada pela doutrinadora Maria Helena Diniz, que encontrou uma solução bastante interessante para o problema.

 

Poder-se-ia até mesmo afirmar que na vida intra uterina tem o nascituro (…)  personalidade jurídica formal, no que atina aos direitos personalíssimos, ou melhor, aos direitos da personalidade, visto ter carga genética diferenciada desde a concepção (…), passando a ter personalidade jurídica material, alcançando os direitos patrimoniais e obrigacionais, que se encontravam em estado potencial, somente com o nascimento com vida (CC, art. 1.800, §3°). Se nascer com vida adquire personalidade jurídica material, mas se tal não ocorrer nenhum direito patrimonial terá (grifos no original)[21].

 

O promotor Leonardo Barreto Moreira Alves, no entanto, criticando o posicionamento acima transcrito, entende ser impossível a divisão da personalidade em duas, afirmando ser ela una e indivisível.

 

Não obstante ser esse o posicionamento atual do Código Civil (no sentido de adotar a Teoria da Personalidade Condicional), cresce cada vez mais na doutrina e na jurisprudência a teoria concepcionista para permitir que o nascituro adquira, de logo, direitos de ordem patrimonial.

Assim, a concepção seria o marco para a aquisição da personalidade jurídica plena, não mais a condição suspensiva do nascimento com vida.

Ora, é no mínimo ilógico admitir a fração da personalidade em duas. Ela é uma e plena: ou está configurada em um único momento ou então ainda não existe. Não há meio termo.

Data maxima venia, inadmissível a dicotomia entre personalidade formal e material.

O conjunto dos direitos da personalidade configura uma universitas júris, um todo ilimitado.[22]

 

Data venia, parece que o promotor equivoca-se ao afirmar que a personalidade é una e plena e que os direitos patrimoniais integram os chamados direitos da personalidade, formando uma universitas júris.

Ora, dissemos anteriormente que a personalidade é o conjunto dos direitos que se manifestam através da pessoa e que existem duas classes de direitos: os direitos de humanidade e os direitos de relação.

Assim sendo, há um tipo de personalidade para cada grupo de direitos a ser adquirido pelo indivíduo que, quando a todos adquire, passa a possuir uma personalidade plena. Antes deste momento, ela é apenas parcial e referente aos direitos já adquiridos.

Na realidade, o entendimento do promotor parece confundir personalidade com humanidade. A característica do humano é adquirida com a concepção. Contudo, direitos há que necessitam mais do que a humanidade para que passem a integrar o rol de direitos de um indivíduo. Estes são, como dito acima, os direitos de relacionamento.

Desta forma, parece que a solução mais adequada foi a encontrada pela doutrinadora Maria Helena Diniz, não havendo equívocos doutrinários em subdividir a personalidade jurídica do indivíduo.

 

3 DA PERDA DE DIREITOS

 

Como acima visto, a questão quanto à aquisição de direitos é bastante tormentosa e está longe de ser pacificada, mesmo tendo o CC se ocupado da disciplina da matéria em seus artigos iniciais.

O momento da perda dos direitos pelo indivíduo ou, mais precisamente, da cessação da personalidade civil, não escapa à turbulência e está, cada vez mais, gerando discussões no âmbito médico-jurídico, mesmo tendo o CC disciplinado que este ocorrerá com a morte, nos termos do art. 6°.

Em geral, os doutrinadores não tecem maiores considerações sobre o momento da cessação da pessoa natural. Afirmam, apenas, que a personalidade jurídica se extingue com a morte real, mas não conceituam o que seja esta morte.

No entanto, a definição da morte é um tema bastante importante e, de forma alguma, deve ser negligenciado pelo Direito, já que, em razão das novas técnicas criadas pela Medicina e que estão cada vez mais ao alcance da maioria da população, o conceito que nos foi transmitido durante anos evoluiu, passando da morte clínica (cárdio-respiratória) para a morte encefálica[23].

Esta nova definição de morte, mais conhecida como “morte cerebral”[24], começou a ser utilizada por um comitê da Universidade de Harvard, em 1968. Este conceito foi adotado logo após a realização do primeiro transplante e, a partir daí, foi aceito em praticamente todos os países do mundo desenvolvido.

Para que se entenda com clareza o alcance desta definição, mostra-se importante explicitar, ainda que de forma superficial e salientando apenas os aspectos mais importantes, em que consiste o encéfalo.

Trata-se de um componente do Sistema Nervoso Central - SNC[25] que se localiza dentro do crânio. É constituído de tronco cerebral, cerebelo e cérebro, observando-se que através da definição de cada um destes e de suas funções é possível se chegar à compreensão da importância e da função do encéfalo.

O tronco cerebral é a parte do encéfalo que está em contato com a medula espinhal, sendo responsável pelas funções básicas do indivíduo, como respiração, batimentos cardíacos e pressão arterial.

A parte que envolve o tronco cerebral é chamada de cerebelo e localiza-se na porção posterior do cérebro. É responsável pelos movimentos (atividade motora) e pelo equilíbrio.

O cérebro, por seu turno, é o órgão que ocupa quase a totalidade da cavidade craniana, razão pela qual normalmente é confundido com o encéfalo e as duas expressões são utilizadas como sinônimas. Suas funções básicas são: coordenação dos movimentos e dos sentidos, o raciocínio, as emoções e a aprendizagem. Das funções citadas, é importante destacar que as que integram as capacidades cognitivas, ou seja, as funções que fazem de um indivíduo um ser consciente, são desenvolvidas em uma parte muito especial do cérebro: o córtex cerebral. Este se encontra na parte externa do cérebro, com cerca de seis milímetros de espessura, e possui coloração acinzentada[26].

Verifica-se, portanto, que o encéfalo controla a vida do indivíduo e que sem seu funcionamento perfeito várias funções podem restar comprometidas, comprometendo, por conseqüência, as relações do indivíduo e sua própria vida.

Visto isso, passa-se à análise do conceito de morte encefálica.

Este critério de morte foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro através da Lei 9.434, de 4 de fevereiro de 1997, que dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo para a consecução de transplantes e tratamento médico. O art. 3° estabeleceu que o Conselho Federal de Medicina – CFM deveria fixar os critérios para a verificação da morte encefálica, o que foi feito através da Resolução n° 1.480/1997. Esta, em seu art. 3°, determina que somente poderá ser verificada a morte encefálica se esta for resultante de um processo irreversível e com causa conhecida[27]. Sem tais requisitos não se poderá falar em morte.

O art. 4° da mesma Resolução determina que este processo irreversível será constatado através de parâmetros clínicos, quais sejam, “coma aperceptivo com ausência de atividade motora supra-espinhal e apnéia”. Além da constatação destes parâmetros será realizado um exame complementar, no qual será verificada a circulação sanguínea intracraniana, a atividade metabólica cerebral ou a atividade elétrica cerebral. Se, realizado um destes exames, o resultado for positivo, o diagnóstico de morte encefálica está descartado.

Assim, é possível perceber que está morto todo aquele ser que perde, definitiva e irreversivelmente, as funções de todo o encéfalo, comprometendo irreversivelmente a vida de relação e a coordenação da vida vegetativa.

Ressalta-se que não é possível falar em morte se somente a vida de relação for prejudicada, pois que esta vida, como acima relatado, é mantida por parte do encéfalo, precisamente o córtex cerebral, e não pelo encéfalo em sua totalidade. Outrossim, não é a perda definitiva da capacidade de manter as funções vegetativas que caracteriza um indivíduo como morto encefálico. É necessário que todo o encéfalo fique irreversivelmente lesionado e pare de funcionar.

Outrossim, não é a presença de certos estímulos nervosos que afasta a verificação da morte cerebral. Tal pode ser percebido através da análise do protocolo a ser preenchido pela equipe médica para a constatação da morte encefálica. O item E 1 do anexo dispõe que “sinais de reatividade infraespinhal” não são capazes de excluir o diagnóstico de morte encefálica, já que estes são coordenados pela medula espinhal, e não pelo encéfalo. Isso porque os nervos responsáveis por estes estímulos são diretamente ligados à medula, não interferindo o encéfalo em sua ocorrência[28].

Importante ressaltar que a morte encefálica não se confunde com o coma ou estado vegetativo. Isto porque no coma o encéfalo está vivo e executa as funções de manutenção da vida. Pode não existir consciência ou movimentos voluntários, mas as demais funções cerebrais automáticas estão presentes, já que ocorrentes a circulação e a oxigenação cerebral. No caso da morte encefálica, apenas o coração pode continuar batendo (já que bate em razão de marcapasso próprio), mas as demais funções já não são mais realizadas.

A classe médica não atingiu unanimidade em relação à adequação e correção do conceito de morte encefálica, embora o CFM tenha manifestado-se amplamente favorável à sua utilização.

A maior crítica da classe médica não reside na existência, em si, da conceituação da morte encefálica e de sua utilização pela Medicina. O que criticam na Resolução do CFM é o chamado teste de apnéia. Nele, o paciente é submetido ao desligamento dos respiradores por dez minutos, a fim de que se possa verificar se ele é capaz de respirar sem o auxílio dos aparelhos[29]. Findo o prazo, o respirador é religado.

Os especialistas afirmam que este teste acaba por lesionar definitivamente as células encefálicas, pois que estas ficam sem oxigenação por grande lapso temporal. Afirmam que este teste é que seria responsável pela morte encefálica (irreversibilidade do quadro), e não a causa que deixou o paciente em coma.

Ainda, afirmam que o correto seria que os exames complementares (art. 6° da Resolução do CFM) fossem realizados antes do teste de apnéia, pois somente assim ter-se-ia acesso à real situação da atividade encefálica do paciente pretensamente morto.

Em razão da falta de conhecimento da área médica, não nos é possível a tomada de posição com relação ao acerto dos critérios utilizados pelo CFM. No entanto, é certo que tal questão deve ser enfrentada pelo Conselho, já que não é possível se admitir que pacientes morram em razão da incorreção dos métodos e critérios médicos utilizados.

Também no campo filosófico o critério da morte encefálica não é entendido como idôneo. O filósofo australiano Peter Singer entende ser errônea sua determinação, entendendo-a como uma “ficção prática”, embora dotada de logicidade, que serviria apenas para salvar órgãos para fins de transplante (e, conseqüentemente, vidas) e suprimir tratamentos inúteis (dada a irreversibilidade do quadro), já que seria impossível aceitar que indivíduos com o corpo quente e o sangue circulante estariam mortos[30].

Parece, no entanto, que a solução trazida à tona pela conceituação da morte encefálica não é equivocada. Isso porque, com a perda irreversível da atividade encefálica (frise-se: o indivíduo não mais poderá retomar a atividade encefálica) o indivíduo deixa de ser um ente humano, pois que deixa de existir nele a característica essencial do ser humano e que o diferencia dos demais seres animados: a racionalidade. Assim, além de prática e lógica, a utilização da morte encefálica estaria também correta.

Neste sentido é a posição do penalista alemão Claus Roxin:

 

Penso, entretanto, e com a opinião dominante na ciência, que nada disso basta (referindo-se à ausência de rigidez cadavérica no morto encefálico) para que se fale de uma pessoa viva nos casos de morte encefálica. Pois a vida vegetativa, que existe de forma variada também na natureza, não é o suficiente para fazer de algo um homem. A pessoa encefalicamente morta carece, de antemão, de qualquer possibilidade de pensar ou sentir; falta-lhe o centro de integração, que estruturará as diversas funções do corpo numa unidade. O critério de morte encefálica como o momento da morte é, assim, um dado prévio antropológico, e não como que uma construção para possibilitar transplantes de órgãos[31].

 

Quanto ao Direito, parece que a determinação legal do conceito e a nova definição médica do que seja morte não foram percebidos pelos juristas. Isso porque somente o adotam para as hipóteses de doação de órgãos, continuando a aplicar o conceito de morte clínica (cárdio-respiratória) para os demais casos e taxando como violadores do direito à vida os que defendem a utilização do conceito de morte encefálica a todas as hipóteses de ausência definitiva de atividade encefálica.

Isto se deve, especialmente, ao fato de que o assunto não é discutido nos meios acadêmicos. E isso em razão de ser muito pouco desenvolvido, ainda, em nosso país, o Biodireito, e de a Bioética ser um assunto trazido à discussão pelos operadores jurídicos somente há poucos anos (em razão de o desenvolvimento da Medicina remontar apenas às últimas décadas do século XX). Deve-se, em verdade, estimular o desenvolvimento desta área do Direito, já que traz grandes reflexos tanto na esfera pessoal como na esfera jurídica do indivíduo, principalmente quanto ao patrimônio.

 

4 DA ANENCEFALIA: CONCEITO E CARACTERÍSTICAS

 

A anencefalia é uma má-formação congênita resultante de defeito de fechamento do tubo neural. Esta estrutura fetal é a precursora do SNC. Vale dizer: é a partir da formação do tubo neural que o SNC irá se formar. Assim, defeitos no tubo neural implicarão, certamente, em problemas futuros no SNC[32].

Este defeito de fechamento ocorre por volta do vigésimo quarto dia após a concepção, já que é neste período em que o tecido formado pelas células fetais, que se apresentava até então em uma forma plana, começam a formar um tecido que se invagina, forma pregas, e começa a fechar-se completamente, formando uma estrutura tubular.

Para que melhor se entenda o processo de formação do tubo neural, é interessante que se proceda à transcrição da explicação do fenômeno realizada pelo médico Ernesto Beruti:

 

Até o final da terceira semana de desenvolvimento, o embrião tem a forma de um disco plano. No meio de sua parte dorsal se origina a placa neural, conjunto celular que, no período ao qual aludimos, inicial um processo de formação de pregas, de invaginação, que continua com a elevação progressiva de suas bordas, até que se juntem, transformando-se em um canal que, após sucessivas etapas, vai se fechando até formar um tubo totalmente fechado, longitudinal de acordo com a forma do embrião. Uma semana após, o tubo neural apresenta uma região caudal mais fina, que dá origem à medula espinhal e a três vesículas cerebrais, maiores, localizadas na parte anterior, e que darão origem ao encéfalo ou cérebro (sic). A partir da quarta semana se algum destes grupos celulares sofre danos por agentes patológicos, podem produzir-se dois efeitos opostos: ou o embrião morre ou, se sobreviver, o dano deverá ser definitivo, impedindo o fechamento total do tubo neural local e fator anatômico desencadeante do processo de anencefalia[33].

 

Assim, percebe-se que, no caso do anencéfalo, o tubo neural não se fecha completamente, passando o indivíduo a ser portador do defeito da anencefalia.

Note-se que o problema com o fechamento do tubo neural não ocasiona somente a anencefalia. Esta somente ocorrerá se o defeito atingir a extremidade distal do tubo neural. Se, ao contrário, o defeito ocorrer na extensão do tubo neural dará origem à espinha bífida, má-formação na qual o feto tem a espinha exposta ao líquido amniótico ou separada deste por uma camada de pele[34].

A ocorrência da anencefalia não pode ser ligada a uma causa específica: é um defeito multifatorial ligado, principalmente, às deficiências de vitaminas do complexo B, especialmente o ácido fólico. Tanto que especialistas prescrevem a ingestão desta substância nos três meses anteriores ao início da gestação e nos três meses posteriores à concepção. Outrossim, no Brasil, foi determinado o enriquecimento da farinha com o ácido fólico, a fim de prevenir o aparecimento de defeitos do tubo neural[35].

Este defeito provoca que o cérebro do feto não seja formado, não possuindo o anencéfalo nenhum tecido cerebral ou, se possui-lo, este tecido é amorfo e encontra-se solto no líquido amniótico. Não há, portanto, a formação dos hemisférios cerebrais e nem do córtex cerebral[36].

Quanto ao tronco cerebral, este pode ou não apresentar defeitos, sendo mais comum que os apresente. No entanto, esta não é uma característica essencial. Disso se depreende que o feto anencefálico, em caso de o defeito não ter atingido o tronco cerebral, pode ser capaz de respirar sem a ajuda de aparelhos.

Assim, o que se observa é que, em realidade, a anencefalia não se refere à lesão de todo o encéfalo, mas somente de uma de suas partes – mesmo que a maior e mais importante delas – o cérebro. Disso resulta que as funções superiores do SNC, como “consciência, cognição, vida relacional, comunicação, afetividade e emotividade”[37], restam inexistentes em um feto portador de anencefalia, restando apenas funções inferiores, que controlam a respiração e as funções vasomotoras.

O diagnóstico da anencefalia pode ser feito já a partir do terceiro mês de gestação (entre a décima segunda e a décima quinta semanas), através da realização de ultra-sonografias. Isso porque o feto portador de anencefalia apresenta uma característica única e inconfundível: não possui os ossos do crânio (a partir da parte superior da sobrancelha não há osso algum), razão pela qual sua cabeça não possui o formato arredondado. É por este motivo que comumente o feto portador desta anomalia é chamado de feto-rã. No local (e apenas em alguns casos) há somente o couro cabeludo cobrindo a porção não fechada por ossos.

Visualmente, além da abertura que existe em sua cabeça, o anencéfalo possui os olhos saltados em suas órbitas, justamente porque estas não ficaram bem formadas em razão da inexistência dos ossos do crânio. Outrossim, seu pescoço é mais curto do que o pescoço de um feto normal.

Desta forma, o diagnóstico da anencefalia é inequívoco e não existem possibilidades de erro.

Quanto aos números, é difícil precisar a incidência de casos de anencefalia. Acredita-se que a proporção de anencéfalos seja de seis décimos para cada mil nascidos vivos (clinicamente) e de dois a cada mil gestações[38]. Destes números fica claro que muitos dos fetos morrem (clinicamente) antes mesmo do nascimento.

Ainda, com relação às características desta má-formação, importante definir que a anencefalia não se confunde com deficiência. A anencefalia é uma má-formação fetal que inviabiliza, na totalidade dos casos, a vida extra-uterina, sendo que quase a metade dos fetos portadores deste problema congênito falecem ainda no útero materno. A deficiência, por seu turno, pode ser definida como lesões, limitações das atividades ou restrições de participação[39]. Pode decorrer da idade do indivíduo, de acidentes ou ser congênita. A deficiência não é incompatível com a vida, tanto que o Brasil, segundo o Censo realizado em 2000, teria mais de quatorze pontos percentuais de sua população portadora de algum tipo de deficiência[40].

 

5 O status do anencéfalo e a aquisição de direitos

 

A doutrina manifesta-se muito pouco acerca do status do feto anencefálico e da possibilidade ou não que ele possui de adquirir direitos. Fala-se mais com relação ao direito à vida, alguns lhe negando esse direito e outros lhe assegurando totalmente ou somente até determinado período, sempre procurando a solução a respeito da possibilidade ou não de punição da gestante e dos médicos em caso de aborto. A discussão cinge-se, então, à esfera penal e diz com apenas um dos tantos direitos que podem ser concedidos a um nascituro.

Mas a discussão levada a efeito no âmbito penal não é de todo inócua para o Direito Civil. Pelo contrário, é possível utilizar as discussões e os posicionamentos que existem nessa área do Direito e aplicá-los aqui, ampliando os conceitos para que abranjam a todos os direitos civis com os quais o nascituro pode ser contemplado.

Dentro deste quadro de análise é possível a individualização de duas correntes. A primeira delas concede ao anencéfalo todos os direitos civis aos quais um feto normal tem acesso. A segunda entende que os anencéfalos não podem ser sujeitos de direito, baseando, no entanto, este entendimento em diferentes pontos de vista.

Passa-se à análise dos fundamentos e das conseqüências civis de cada uma delas.

A primeira corrente entende que o feto portador de anencefalia seria titular de direitos de humanidade desde a concepção e, em caso de respiração após o parto, adquiriria os direitos de relação. Assim, a anencefalia em nada alteraria a qualidade do feto portador desta má-formação e nem tampouco as conseqüências de seu nascimento, em caso deste ocorrer com vida[41].

Esta posição defende que o aborto do feto anencefálico seria punível, já que o feto, desde a concepção, tornou-se titular de direitos de humanidade. Entende, ainda, que a legalização do aborto nestes casos abriria precedentes para o aborto eugenésico, o que não poderia ser tolerado.

Esta corrente é principalmente defendida por religiosos e encontra respaldo nas discussões levadas a termo pela Igreja Católica através da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, razão pela qual um dos argumentos suscitados é a existência de mandamento bíblico que proíbe a matança de qualquer ente humano (“não matarás”).

Este entendimento preleciona ser inaplicável aos fetos portadores de anencefalia o conceito de morte encefálica. Afirmam seus defensores que “o feto anencéfalo manifesta sinais vitais no ventre materno e morre algum tempo depois”[42] do parto. Estes sinais vitais, portanto, excluiriam o diagnóstico de morte encefálica.

Efetivamente, o feto anencefálico pode apresentar sinais vitais, já que em alguns casos o tronco cerebral, que é responsável pelas funções vitais do organismo humano, não é lesado pela anencefalia, ou é lesado somente parcialmente, mantendo, principalmente, a função da respiração. No entanto, tal não é uma característica absoluta.

Ainda, o argumento utilizado pelo promotor Victor Santos Queiroz[43], defensor desta corrente, é o de que o diagnóstico de morte encefálica pressupõe a existência de vida e que o feto, efetivamente, nasceria vivo, em razão da respiração. Adquiriria, assim, todos os direitos de humanidade e todos os direitos de relação. Em conseqüência disso, qualquer tipo de atentado contra o feto seria um atentado contra a vida e, portanto, um aborto, pois que violado o mais importante direito do feto.

No entanto, o promotor parece não levar em consideração a existência de dois tipos de morte e o fato de a morte encefálica excluir a necessidade de declaração da morte biológica. Assim, mesmo que biologicamente vivo, o indivíduo já está morto encefalicamente para todos os fins de direito.

Desta forma, mostra-se frágil o argumento utilizado pelo promotor de que, simplesmente em razão da declaração do CFM de que o feto anencefálico morre clinicamente ainda na primeira semana de vida, o diagnóstico de morte encefálica deveria ser excluído.

Aqueles que entendem que o feto anencefálico não pode ser declarado titular de direitos baseiam-se em dois pontos: na inexistência de vida humana e na ocorrência de morte. A partir de agora, se procederá à análise de cada um destes entendimentos.

A corrente que entende que o anencéfalo não possui vida humana baseia seu posicionamento no Direito Romano, que negava humanidade àqueles cuja forma não fosse correspondente à forma humana, por entender que estes seres eram resultado da cópula entre uma mulher e um ser irracional, do que resultava um ser inumano ou híbrido. Entretanto, com o avanço da ciência verificou-se que esta hipótese é impossível, já que o coito de mulher com um irracional é improfícuo.

Para corroborar o entendimento romano, os defensores desta corrente utilizam como argumento o fato de os dicionários da língua portuguesa definirem anencefalia como uma monstruosidade. Sendo um monstro, seria lógico afirmar que o feto anencefálico não poderia ser pessoa.

Este entendimento preleciona que a existência ou não de um ser humano é determinada pela cabeça: qualquer ser que não possuir uma cabeça igual à cabeça dos demais seres humanos não pode ser considerado um humano, pois destoa do padrão da espécie.

O vocábulo cabeça, acima citado, possui duas significações. A primeira delas é a de cabeça como parte do corpo humano. Efetivamente, ao olhar para um feto anencefálico se percebe que ele não possui uma cabeça igual à dos demais seres humanos, já que não é arredondada, mas apresenta uma profunda depressão na parte superior.

A segunda acepção pode ser entendida como ausência de racionalidade. De fato, um feto anencefálico não pode relacionar-se consigo e nem com os outros seres, não pode pensar, sentir ou exercer qualquer função que seja típica de um ser humano e que o diferencie dos demais seres irracionais com os quais convive: ele não possui razão. Isso porque a porção cerebral responsável pela realização destas funções de relação e de racionalidade é inexistente nestes fetos. Essa parte é justamente o córtex cerebral, a parte mais externa do cérebro[44].

 

Que é este ser vivo anencefálico? Parece honesto afirmar que não é um ser da espécie animal pois as características básicas do animal são sentir dor e prazer, impossível num feto anencefálico. Também é difícil classificá-lo como um ser da espécie humana, cuja característica essencial é a possibilidade de pensar, perguntar e tomar decisões. Poderia ser classificado como realidade vegetativa? É coerente deduzir que se trata de realidade inespecífica. Pode ser entendido como ato falho da natureza, que previa produzir um ser humano, mas gerou uma realidade indecifrável: um erro.

Então, impõe-se uma conclusão fundamental: no feto anencefálico não temos uma pessoa[45].

 

Roosevelt Arraes, um dos defensores deste posicionamento, chega ao extremo de chamá-lo de “ser vivo disponível”, comparando-o a coisa e entendendo que dele possa dispor a genitora como melhor lhe aprouver. À mesma conclusão chega a psicóloga Vera Iaconelli, afirmando que “não há bebê”, razão pela qual não ocorreria aborto, baseando seu posicionamento na tese de que a inexistência de cérebro tornaria o feto anencefálico um ser não humano.

Não sendo considerado humano, o feto anencefálico não teria direito à proteção estatal, não adquiriria direitos de humanidade e, muito menos, direitos de relacionamento. O feto anencefálico não seria, portanto, titular de direitos, mas sim objeto de direitos. Arraes, no entanto, faz uma ressalva de que os direitos de humanidade[46] somente lhe seriam negados após o diagnóstico da má-formação congênita.

No entendimento jurídico, no entanto, esta posição apresenta contradições e não pode ser aplicada. Em primeiro lugar porque, como já dito anteriormente, é ente humano todo aquele ser que provém da união de gametas humanos, do homem e da mulher, todo aquele ser cuja origem é um zigoto humano. Este ser tem origem idêntica à de qualquer outro ser humano e não se assemelha a nenhum outro exemplar de alguma espécie de ser irracional animado, pelo que não pode pertencer a qualquer outra categoria de seres.

Outrossim, mostra-se conflitante o fato de que um ser seja considerado pessoa pelo Direito e, a partir da verificação de certa hipótese, deixe de sê-lo e perca (ao que parece, de forma retroativa), assim, todos os direitos que antes lhe eram garantidos justamente por pertencer à raça humana. Ainda, ressalte-se que este posicionamento leva em conta não o momento da ocorrência da má-formação, mas sim o momento de seu diagnóstico, para fixar o termo final dos direitos de humanidade. Nestes termos, chegar-se-ia à hipótese absurda de que, após a existência da má-formação e antes de seu diagnóstico, poder-se-ia falar em abortamento do feto portador de anencefalia, mas, tão logo feito o diagnóstico, a conduta, sobre o mesmo feto portador de anencefalia fosse considerada lícita, por representar a livre disposição materna sobre seu próprio corpo e sobre uma coisa que lhe pertence.

Tal hipótese carece de racionalidade.

No sentido de que é o momento da concepção que torna um ser um ente humano ou não, e não qualquer modificação ulterior, tem-se o entendimento do médico Ernesto Beruti:

 

Ao estar privado de calota craniana, hemisférios cerebrais e córtex cerebral não se relega (o anencéfalo) à categoria ou família dos sub-humanos “… nenhuma patologia posterior à concepção transforma a pessoa em um produto sub-humano…” (Suprema Corte de Justiça da Nação)[47].

 

Dentre os que defendem a não concessão ou a concessão parcial (sendo titulares apenas por determinado período) de direitos aos anencéfalos, os favoráveis à idéia de que o feto anencefálico está morto estão em maior vantagem numérica.

O entendimento de que seriam entes mortos é demonstrado com clareza por Samantha Buglione:

 

(…) para se ter direito à vida é preciso estar vivo; somente é possível proteger a vida havendo vida (…). Um feto anencefálico é um feto vivo? O direito, através da Lei de Transplantes, na qual define que morte é morte cerebral, diz que não. O que temos no caso do feto anencefálico é um organismo que vive. Da mesma forma que um coração que está sendo transplantado vive. Então a pergunta: o direito à vida também existe para fetos que jurídica e tecnicamente estão mortos? Fora do útero um feto nestas condições vive tanto quanto alguém em morte cerebral vive sem os aparelhos.[48]

 

Este entendimento tem ganhado força nos últimos anos no Brasil, principalmente em razão do ajuizamento, em 2004, perante o Supremo Tribunal Federal - STF, de uma Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF, que pretende que o STF manifeste-se no sentido de não ser punível a conduta da mãe e da equipe médica em caso de antecipação do parto de um anencéfalo. Entendem, inclusive, que nestas hipóteses não haveria aborto, mas sim uma antecipação terapêutica do parto[49], já que o feto anencefálico não estaria vivo.

A liminar, no processo, foi deferida pelo Ministro Marco Aurélio de Melo. No entanto, após quatro meses, foi revogada pela Corte Superior. Vale ressaltar, por oportuno, que na liminar não foram analisadas questões relativas ao mérito, mas, apenas, foi ressaltado que estaria inocorrente o periculum in mora e, assim, careceria a liminar dos requisitos para ser concedida. O Direito brasileiro, desta forma, ainda não tem posição esposada pelas instâncias superiores com relação à matéria.

Dílio Procópio Drummond de Alvarenga, professor aposentado da cadeira de Direito Penal, manifestou-se no sentido de que, de fato, não haveria aborto, pois que inexistente tipicidade em razão da falta de objeto jurídico, da falta de sujeito passivo próprio e da falta de objeto material. E arremata: “o fato não é mais do que um quase-crime, na modalidade de crime impossível [50](grifamos).

De fato, quando são rememoradas as lições de Direito Penal, aprendidas logo nas primeiras cadeiras do Curso de Direito, percebe-se que foi ensinado que seria crime impossível matar um ser humano que já estivesse morto em razão de outra circunstância (nexo causal). Da mesma forma, não seria praticado aborto se o feto já estivesse morto. Nestes casos, ressalte-se, sempre foi levado em conta somente o conceito de morte clínica.

Esta lição pode ser aplicada de forma análoga ao caso do feto anencefálico, pois que a vida nele não mais existiria, em razão da inexistência de atividade cerebral. Assim, impunível o atentado contra o ser dentro do ventre materno, mesmo que seu sangue ainda estivesse fluindo, pois que a vida já lhe teria abandonado.

No entanto, os defensores desta teoria divergem quanto ao fundamento da morte. Alguns defendem que o feto estaria morto por poder a ele ser aplicado o conceito de morte encefálica. Outros, no entanto, entendem que a situação é análoga à da morte encefálica, mas que seria conceitualmente equivocada a afirmação de que o feto anencefálico seria um morto encefálico.

Os que se filiam à corrente da existência da morte encefálica usam como argumento principal o fato de que o CFM, na Resolução n° 1.752, de 13 de setembro de 2004, afirmou que os anencéfalos seriam “natimortos cerebrais”. Sobre a posição do Conselho nos deteremos quando for tratada a equiparação das situações de morte encefálica e do anencéfalo.

Ao que tudo indica, no entanto, esta posição resta equivocada, embora seus efeitos não sofram qualquer variação.

Com efeito, está com a razão a doutrina defendida pela Igreja Católica e pelos mais conservadores de que o conceito de morte encefálica não possa ser estendido a fetos portadores de anencefalia.

Ora, para que um ser seja declarado morto encefálico é necessário que alguns requisitos sejam observados. Dentre eles, o feto deve ter nascido e completado, no mínimo, sete dias de vida extra-uterina. Ora, no caso do anencéfalo, o cumprimento deste requisito é impossível na quase totalidade dos casos, já que mais da metade morre clinicamente ainda dentro do útero materno e os que sobrevivem ao parto morrem clinicamente logo após este evento, não suportando mais do que alguns minutos fora do ventre materno.

Outrossim, mesmo que se desconsiderasse esse fato, ainda assim não seria possível tal declaração ainda no ventre materno, pois que dentro do útero não é possível a realização dos exames necessários e determinados pela Resolução do CFM (testes de apnéia, de verificação da atividade supra-espinhal e testes complementares).

Ainda, o anencéfalo apresenta, em alguns casos – principalmente naqueles em que nasce com vida clínica – lesões totais apenas no cérebro, sendo que o cerebelo e, principalmente, o tronco cerebral, funcionam normalmente ou, ao menos, mantém um mínimo de atividade. Ora, para a declaração de morte encefálica é necessário que todo o encéfalo fique irreversivelmente lesionado, e não somente a sua parte principal – o cérebro.

Outrossim, importante ressaltar que para a declaração de morte encefálica é indispensável a ausência de capacidade de respiração sem o auxílio de respiradores mecânicos, o que ratifica a necessidade de lesão total de todo o encéfalo. No entanto, em alguns casos, dependentes do grau de lesão do tronco cerebral pela anencefalia, os bebês portadores desta anomalia são capazes de respirar sem o auxílio de qualquer tipo de aparelho.

Diante do que foi dito acima, é possível perceber que um anencéfalo não pode ser declarado morto encefálico.

No entanto, sua situação mostra-se análoga à de qualquer indivíduo com morte encefálica, se mostrando dispensável a realização dos exames determinados pelo CFM para que se saiba que o anencéfalo não possui atividade supra-espinhal.

Ora, os reflexos que o anencéfalo pode vir a apresentar são decorrentes de atividade infra-espinhal, já que os nervos do corpo são perfeitos e corretamente ligados ao cerebelo (que, lembre-se, pode não sofrer danos decorrentes da anencefalia). São, precisamente, os reflexos descritos pelo item E I do anexo da Resolução 1.480/97 do CFM. No entanto, este feto não pode decodificar, identificar os estímulos que recebe e os reflexos que apresenta, já que seu cérebro – o responsável por esta função – simplesmente inexiste em sua caixa craniana.

Além disso, é possível comparar as situações, uma vez que a anencefalia, da mesma forma que a morte encefálica, é resultante de um processo irreversível[51], de causa conhecida e que retira de seu portador qualquer chance de sobrevida – todos estes requisitos indispensáveis para a declaração de morte encefálica.

Na verdade, os exames que a Resolução 1.480/97 do CFM determina que obrigatoriamente sejam realizados para que possa ser uma pessoa declarada morta encefálica são indispensáveis somente para demonstrar a irreversibilidade do dano encefálico. No caso do anencéfalo, no entanto, não é preciso a realização de qualquer tipo de exame complementar à ultrassonografia. O cérebro não existe, não pode realizar qualquer tipo de função e não há qualquer possibilidade de que venha a exercer suas funções corretamente.

Desta forma, parece que convém denominar o anencéfalo de morto cerebral, e não de morto encefálico, já que não possui, necessariamente, a totalidade de seu encéfalo comprometido pela má-formação. Deve-se, assim, utilizar a nomenclatura adotada pelo CFM na Resolução 1.752/04 (natimorto cerebral), mesmo que nesta o Conselho a tenha utilizado inadequadamente e como sinônima de morte encefálica[52].

No entanto, esta expressão deve ser utilizada em razão da necessidade de rigorismo técnico no momento da utilização de termos técnicos e para a sua correta interpretação. Isso porque, quer se utilize uma ou outra expressão, embora as causas e os diagnósticos sejam distintos, os efeitos serão rigorosamente os mesmos: a conceituação do anencéfalo como um ser morto e incapaz de receber a proteção do Estado da mesma forma da proteção dispensada a um feto vivo.

Assim, mesmo que venha a sobreviver clinicamente dentro do útero materno e venha a respirar logo após o parto, o feto anencefálico está morto, não em razão de morte encefálica, mas por estar em situação análoga a dos mortos encefálicos – por ser um morto cerebral –, já que o anencéfalo, mesmo não podendo ser objeto dos exames determinados pela legislação aplicável à morte encefálica, possui atividades cerebrais com as mesmas características das atividades apresentadas pelo morto encefálico: nulas.

A afirmação de ser o feto anencefálico um feto morto não implica em dizer-se que este feto não possui direitos.

Em verdade, o feto anencefálico adquire direitos de humanidade no momento da concepção e os perde justamente quando o tubo neural sofre a má-formação e não se fecha completamente. Vale dizer: há a perda dos direitos de humanidade no momento que a má-formação que acarreta a morte do indivíduo ocorre. Isso se dá entre o vigésimo quarto e vigésimo quinto dia após a concepção. Disso resulta que os direitos de humanidade são gozados pelo feto anencefálico por um período muito curto, como curta é a sua existência.

Desta forma, nenhum direito pode ser adquirido pelo anencéfalo depois deste evento. E isto independe da ocorrência do nascimento deste feto e, em caso de nascimento, de ter ocorrido respiração. O feto anencefálico já está, ao tempo do nascimento, cerebralmente morto, em condição análoga à do morto encefálico, pois que o evento que ocasionou a morte e a ausência de parte do encéfalo já ocorreu e é irreversível.

Disso resulta que este feto, se não morrer clinicamente antes do parto e se vier a respirar após este evento, não irá adquirir nenhum tipo de direito de relacionamento, ou seja, não irá adquirir patrimônio nem ser titular de obrigações.

Assim, não poderá, ainda no interior do ventre materno, ao contrário do que ocorre com os fetos normais, ser instituído legatário ou herdeiro, pois que tais instituições pressupõem a existência de um indivíduo com potencial de vida, sendo nula quando feitas em favor de mortos. E esta é, precisamente, a situação dos fetos anencefálicos. O feto anencefálico não tem expectativa de vida: a vida já o abandonou e, exceto por intermédio de um milagre, não irá retornar ao seu corpo.

A partir do momento em que ocorre a má-formação o anencéfalo deixa de ser protegido pelo Direito como um ente vivo, mas continua merecendo a proteção estatal, agora não mais como feto ou bebê vivo, mas como morto, tendo direito à imagem, ao cadáver, ao nome, à sepultura, etc.

Deve a doutrina civilista, portanto, rever o posicionamento que considera vivo todo aquele que respira fora do útero materno: o anencéfalo é uma exceção a esta regra.

Do que acima foi dito resulta uma conseqüência muito importante. O feto portador de anencefalia não deve ser registrado como um feto nascido vivo, tornando necessário o registro de nascimento e o registro de óbito. O feto anencefálico deve, isto sim, ser registrado no livro de natimortos, mesmo que venha a respirar após o parto.

Ora, os Registros Públicos são necessários para a concessão de direitos de relação ao indivíduo, para que se saiba com clareza o momento em que foi adquirida a personalidade plena do ser humano.

É inegável que os direitos da personalidade são adquiridos independentemente de formalidades legais, bastando a simples presença dos requisitos elencados pela legislação. No entanto, sem a certidão de nascimento, a um indivíduo, mesmo adulto, não serão reconhecidos esses direitos. Vale dizer, portanto, que a certidão de nascimento foi a forma que o Estado encontrou para exteriorizar que um indivíduo cumpriu, no momento do parto, os requisitos indispensáveis para a aquisição dos direitos de relação.

Disso resulta que, enquanto for efetuado duplo registro do anencéfalo, ele vai continuar a ser identificado como um feto vivo, recebendo todos os direitos de relação. E isto se dará contra legem, já que o anencéfalo nunca possuirá esta capacidade plena, pois que já nasce morto (cerebralmente), ainda que venha a respirar após o parto.

Deve, assim, a Lei dos Registros Públicos ser interpretada de forma a absorver a modificação dos conceitos de morte e não mais ser permitida a registração do anencéfalo como feto nascido vivo.

Ressalta-se, por oportuno, que o motivo pelo qual se entende que os direitos de humanidade devam ser desprezados com relação ao anencéfalo decorre não da inviabilidade da vida extra-uterina, mas sim da morte cerebral que lhe acomete no momento da má-formação do tubo neural.

 

6 CONCLUSÃO

 

Restaram discutidos, no presente trabalho, os critérios e o momento para a aquisição de direitos por um indivíduo, ficando, principalmente, estabelecido que os direitos de humanidade, aqueles decorrentes da natureza humana do ser, são adquiridos desde a concepção e independem da satisfação de qualquer outro requisito. São exemplos destes direitos a vida, a saúde e o nome.

Os direitos de relação, direitos estes que garantem ao indivíduo vantagens sobre outros (são eles os direitos patrimoniais e os direitos obrigacionais). No entanto, somente são adquiridos no momento do parto e sob a condição de que o feto nasça vivo, sendo esta vida representada pela respiração.

Contudo, a regra da respiração como sinônimo de vida apresenta uma exceção, quando o feto, mesmo respirando, está morto na acepção cerebral, mesmo que seu corpo esteja realizando as funções vitais sem interferência ou necessidade de aparelhos.

E isso justamente porque a Medicina e o Direito não mais adotam o critério de morte clínica ou biológica como definidor de morte, mas sim o critério de morte encefálica, situação na qual todo o encéfalo deixa de exercer suas funções de forma definitiva.

O feto portador de anencefalia apresenta situação análoga à do morto encefálico – embora não se possa dizer que ele é um feto com morte encefálica –, podendo-se dizer que a malformação deste feto resulta no diagnóstico de morte cerebral (no dizer do CFM, o feto portador de anencefalia é um “natimorto cerebral”).

As situações de morte cerebral e de morte encefálica decorrem de situações diversas e não podem ser vistas como sinônimas, pois que as partes do corpo lesadas são distintas. Entretanto, apresentam o mesmo efeito, que é justamente a morte do indivíduo em razão de causa conhecida e da irreversibilidade do quadro.

Assim, mesmo que respire fora do útero materno, o feto anencéfalo somente adquire os direitos de humanidade, já que pertence à espécie humana, não lhe assistindo qualquer tipo de direitos de relação. Desta forma, o anencéfalo não pode herdar, ser titular de patrimônio ou em seu nome ser contraído qualquer tipo de obrigação (ressalte-se que isto mesmo que venha a respirar).

Disso resulta que as normas registrais brasileiras devem ser alteradas, a fim de possibilitar que o feto portador de anencefalia, em caso de respiração após o parto, seja registrado apenas uma vez, como natimorto, prescindindo, assim, de dois registros, um de nascimento e outro de óbito. Tal deverá ocorrer a partir da modificação do art. 53, §2° da Lei de Registros Públicos.

Isso porque é o Registro Público de nascimento que demonstra que o indivíduo adquiriu os direitos de relação. Enquanto esta modificação não ocorrer estar-se-á, equivocadamente, premiando bebês incapazes e sem personalidade com direitos que somente deveriam assistir a pessoas vivas.

 

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[2] “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”.

[3] Dados apresentados por CANTARINO, Carolina. Mulher ou sociedade: quem decide sobre o aborto. Disponível em: <http://www.comciencia.br/rportagens/2005/05/05_impr.shtml>. Acesso em: 10 abr. 2005.

[4] Neste estudo somente será analisada a pessoa natural e os direitos e deveres a ela outorgados pelo Direito, sendo utilizado o vocábulo pessoa somente como sinônimo de pessoa natural, de indivíduo.

[5] É correto dizer que somente é possível a ocorrência de capacidade de fato se previamente houver capacidade de direito. No entanto, a recíproca não é verdadeira.

[6] NERY JÚNIOR, Nélson & NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Anotado e Legislação Extravagante. 2. ed., p. 146.

[7] MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil – Parte Geral, vol. 1, p. 64.

[8] Como exemplos é possível citar os Códigos Civis de Portugal, Espanha (que exigia vida autônoma por, no mínimo, 24h), França e Holanda. Tais exemplos são citados em DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, vol. 1, p. 179.

[9] Nascituro é o feto que está por nascer. Pode estar no útero materno ou já em seu exterior, mas ainda ligado à mãe pelo cordão umbilical.

[10] Personalidade. Disponível em: <http://www.ricardoericardo.com.br/dji/dc/personalidade.htm>. Acesso em: 29 set. 2005.

[11] MONTEIRO, op. cit., vol. 1, p. 64.

[12] Ibid, p. 64.

[13] Ibid, p. 64.

[14] Fixação do zigoto no útero materno.

[15] VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil – Parte Geral. 3. ed. pp. 161/162.

[16] NERY JÚNIOR & NERY, op.cit., p. 146.

[17] GOMES, Orlando. Introdução ao Direito Civil. 18. ed. p. 144.

[18] ARRAES, Roosevelt. A extensão dos direitos da personalidade e a situação jurídica do anencéfalo. Disponível em <http://www.universojuridico.com.br/publicacoes/doutrinas/default.asp?action=doutrina&iddoutrina=1735>. Acesso em: 29. set. 2005.

[19] NERY & NERY, 2003, p. 157. O CC os qualifica como direitos da personalidade (Livro I, Título I, Capítulo II). No entanto, parece mais apropriada, para evitar confusões conceituais, a utilização da expressão direitos de humanidade (ou mesmo de direitos personalíssimos) ao invés de direitos da personalidade, até mesmo porque defendemos o posicionamento de que os “direitos da personalidade” (sic) sugeridos pelo art. 2° do Diploma Civil não são os mesmos disciplinados pelo art. 11 e ss. do mesmo diploma legal.

[20] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. vol. 1, 20. ed., p. 120.

[21] DINIZ, op.cit., p. 180.

[22] ALVES, Leonardo Barreto Moreira. O direito de nascer do ventre de mãe morta e demais questões afins: o caso Marion Ploch. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3276>. Acesso em: 10. jun. 2005.

[23] Sobre as razões da necessidade de definição de um novo critério de morte em CRITÉRIOS, 2005.

[24] Tal nomenclatura é equivocada, já que encéfalo e cérebro representam estruturas corporais diversas, conforme se verá a seguir (fazendo a diferenciação destas estruturas ver FRANÇA, 2005). Assim, usaremos somente a expressão morte encefálica. Ao final deste trabalho iremos utilizar a expressão morte cerebral no sentido de lesão exclusiva do cérebro, razão pela qual não se deve incorrer em erro ao utilizar as expressões como sinônimas, sob pena de confusão de conceitos e problemas na interpretação deste trabalho.

[25] O outro componente do SNC é a medula espinhal (CHUDLER, 2005).

[26] CHUDLER, op. cit.

[27] A Resolução expressamente exclui a hipotermia e o uso de drogas depressoras do SNC como causas para a morte encefálica.

[28] No entanto, é o encéfalo que os decodifica e faz com que o indivíduo possa identificá-los.

[29] A ausência de respiração mecânica por tal período seria capaz de aumentar os níveis de concentração de dióxido de carbono no sangue arterial. Alcançando-se certo nível deste gás no sangue e estando o centro respiratório com sua vitalidade preservada, o diafragma voltaria a movimentar-se, ainda que por curto período.

[30] VALLS, Álvaro L. M. Repensando a vida e a morte do ponto de vista filosófico. Disponível em <http://www.bioetica.ufrgs.br/morteamv.htm>. Acesso em: 19 set. 2005.

[31] ROXIN, Claus. A proteção da vida humana através do Direito Penal. Conferência realizada no dia 07 de março de 2002, no encerramento do Congresso de Direito Penal em Homenagem a Claus Roxin, Rio de Janeiro. Disponível em: <http://www.acarvalho.com.br/material/arquivos/a_proteção_da_vida_humana_través_do_direito_penal.doc>. Acesso em: 04 nov. 2005.

[32] Explicação completa a respeito das características do anencéfalo é possível encontrar em: FREITAS, 2005; CORONEL, 2005; e MARTÍNEZ, 2005.

[33] BERUTI, Ernesto. Anencefalia (una visión médica y ética). Disponível em:<http://revistapersona.8m.com/28Beruti.htm>. Acesso em: 03 nov. 2005. Tradução livre.

[34] FREITAS, op. cit.

[35] Para um melhor entendimento das demais causas que podem provocar defeitos congênitos ligados ao tubo neural ver MARTÍNEZ, 2005.

[36] Sobre a definição destas estruturas encefálicas ver o item 2.2.

[37] RIBEIRO, Diaulas Costa. Aborto por anomalia fetal: uma releitura jurídico-penal do aborto por anomalia fetal no Brasil. In DINIZ, Débora & RIBEIRO, Diaulas Costa. Aborto por anomalia fetal. p. 101.

[38] SANEMATSU, Marisa.  Interrupção da gravidez em casos de anencefalia fetal: a cobertura da imprensa sobre a liminar do STF e suas repercussões. Disponível em: <http://www.ipas.org.br/arquivos/10anos/marisa_liminarstf2004.doc>.

[39] ANIS. Anencefalia: o pensamento brasileiro em sua pluralidade. p. 94.

[40] Ibid., p. 94.

[41] Como defensora desta corrente encontramos, por exemplo, a Drª. Amida Bergamini Miotto, juspenitencialista, professora de criminologia e de vitimologia e o Dr. Ernesto Berutti, médico.

[42] AGNELO, Geraldo Majella. Pela vida do feto [Entrevista disponibilizada em 14 de janeiro de 2005, a Internet]. 2005. Disponível em: <http://sentidos.com.br/canais/materia.asp?codpag=7446&codtipo=1&subcat=31&canal=visao>. Acesso em: 29 set. 2005.

[43] QUEIROZ, Victor Santos. Reflexões acerca da equiparação da anencefalia à morte encefálica como justificativa para a interrupção da gestação de fetos anencefálicos. Jus Navegandi, Teresina, a. 9, n. 760, 3 ago. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7111>. Acesso em: 28 set. 2005.

[44] CHUDLER, op. cit.

[45] PEGORARO, Olinto. O feto sem cérebro, a medicina e a ética. Disponível em: <http://www.jb.com.br/jb/papel/brasil/2004/07/26/jorbra20040726012.html>. Acesso em: 31 ago. 2005.

[46] O autor refere-se a direitos da personalidade. Sobre a terminologia ver item 2.1 supra.

[47] BERUTI, Ernesto. Anencefalia (una visión médica y ética). Disponível em: <http://revistapersona.8m.com/28Beruti.htm>. Acesso em: 03. nov. 2005.. Tradução livre.

[48] BUGLIONE, Samantha. Em defesa da vida. Disponível em: <http://www.unisol.org.br/index.php?mod=content&action&id_content=223&id_categorie=1>. Acesso em: 19. set. 2005.

[49] Expressão criada por Débora Diniz e Diaulas Costa Ribeiro e amplamente utilizada por aqueles que defendem a inocorrência de aborto em casos de má-formação fetal incompatível com a vida extra-uterina. É antecipação do parto porque a gestação termina antes do prazo natural. É terapêutica porque é dirigida a resguardar a integridade física e mental da gestante.

[50] ALVARENGA, Dílio Procópio Drummond de. Anencefalia e aborto. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5167>. Acesso em: 28 set. 2005.

[51] Não há cura para a anencefalia, que é letal em cem por cento dos casos. Há somente a prevenção.

[52] O entendimento acerca do erro de nomenclatura, e não de sua utilização proposital, advém da análise do posicionamento do médico Marco Antônio Becker, relator do da referida resolução: “Os conceitos de morte se baseiam em morte encefálica. Os anencéfalos são considerados natimortos” (BARROS, 2004). Também, ver artigo publicado em ANIS, 2004, p. 32.